segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Às vezes surdez - Gilberto Valle


Na sexta passada, viajando a trabalho para a cidade de Gravatá, presenciei mais um absurdo sonoro brasileiro. Lá venho eu de novo, sentar a pua em cima do que somos forçados a ouvir.
Estava com Thiago, traçando uma maravilha de coxinha de charque com catupiry no Rei da Coxinha, quando num comercial televisivo me aparece um bando de rapazes, dançando para uma multidão e cantando coisas terrivelmente ruins. Mas o povão lá, delirando loucamente. O que mais impressiona nisso tudo, é que no espaço de 6 meses (pasmem!), já é a segunda bandinha nesse estilo "Boys Band" (Só que aqui no Brasil deveria ser chamado de Agro Boys Band), que surge, cantando um monte de merdas, se intitulando "O fenômeno universitário". E todas com o selo da Som Livre. Pelo amor de Deus! É de fazer vergonha a qualquer universidade pé de calçada. Nomes? "Love Boys" e a "Tchê Garotos". Valha-me Deus!
O que mais me deixa impressionado e revoltado, é o modo fácil que essas coisas tem de cair na mídia e sair ínumeras vezes na programação comercial da "Toda Poderosa" Rede Globo de Televisão. É o famoso JABÁ! Só pode!
Tudo isto me deixa muito preocupado com o futuro da música brasileira. Cada vez mais as bandas vão se extiguindo, as mentes pensantes vão cansando e a vontade de vencer com a música vai terminando, de tanto dar murro em ponta de faca. Vivemos no país das merdas sonoras musicais! Tudo que é ruim, torna-se bom! E aquilo que é de qualidade melhor, é esquecido nos cantos. Além dos descuidos na hora de informações televisivas. A "Toda Poderosa" passa dos limites e justamente por isso,eu vou contar outro caso. Estávamos na casa de Fernando, na tradicional quarta do futebol e no intervalo do jogo, me espanto! Começa a tocar Little Joy e a Globo fala abertamente - "Little Joy, curta o nascimento de um fenômeno!" Som Livre! Quando falo em descuidos, é justamente porque a referida banda, é apenas um projeto (o que é bastante diferente de banda), e com data para terminar. Inclusive o mesmo já foi encerrado. E aí Globo? Já soltaram a graninha pro projeto ser mantido, para continuar com músicas em Malhação? Porque penso que é assim que rola!
Noto a perda de amor pelas coisas, a descrença nos sonhos e a falta de identidade dos artistas. Jovens talentosíssimos, tendo que se sujeitar (é essa a expressão), a tocar um monte de merdas (adoradas pela sociedade), para ganhar a vida. Enquanto a grande maioria é suprimida pelo submundo das esquinas, cada vez mais reclusos e escassos. É por estas e por outras que há mais de 10 anos não vemos nada de estrondoso no mundo de música de qualidade brasileira, principalmente em termos de rock n´roll. Los Hermanos parece ter encerrado a safra de grandes bandas brasileiras. Simplesmente NADA de inovador, diferente e estonteante surgiu depois deles. Pensando em termos gerais é pior ainda. Só nascem cantoras como cópias de outras. É um bando de covers de Ana Carolina e Zélia Duncan (uma injustiçada, porque canta e faz músicas de muito melhor nível que a primeira, mas o sucesso está com "aquele grande cantor", Ana Carolina), que não está no gibi. Tudo com aquela voz altamente grave e sem sentimento nenhum. Além da pobreza de letras e versões.
Nesse ponto, posso citar dois exemplos que se distinguem entre os meios. Uma se chama Maria Rita, que é uma excelente intérprete! Basta você ter o discernimento de escutá-la sem comparar com a mãe dela. O trabalho da mesma é de qualidade. Ela canta muito, em comparação a qualquer outra.
E o outro exemplo é Vanessa da Matta, que surgiu devagarinho com sua mistura "romântico-alterna", e tem sido uma excelente fórmula, junto com a voz extremamente doce. É música honesta!
Assistir TV já era um suplício, principalmente se tratando de TV aberta, mas de uns tempos para cá, está se tornando agressão. Logo para mim, que amo a música de qualidade e tenho que aguentar além das novelas, as merdas sonoras jogadas na nossa face, sem dó nem piedade.
Depois disso tudo, o que me restou foi comer a coxinha, a única coisa que se salvou. Tô achando que ser surdo às vezes, não é uma má-idéia.






Dedicado a Fernando Lucchesi e, principalmente a Lester Bangs, o maior crítico de rock n´roll da história.

Um comentário:

Ludmila Fernandes disse...

A coisa vem feia não é de agora. Coitada da música boa. O que me resta é ir atrás do que presta. Acabo buscando coisas mais antigas mesmo. Parabéns pelo texto. crítica de qualidade. Bjão